A Organização Project for PublicSpaces (PPS) define o “Placemaking” como um processo acessível a qualquer pessoa que permite explorar a criatividade das cidades. Quando aberto e inclusivo, pode fazer com que as pessoas se sintam atraídas pelos lugares nos quais vivem e sintam-se mais propensas a envolver-se em suas comunidades.
Há pouco tempo a PPS publicou uma série de três artigos sobre esse processo. Este é o primeiro deles e apresenta distintas opiniões sobre a forma de fazer cidade, o papel das comunidades para que a criação de lugares funcione, a função da arte nos espaços urbanos e como estes podem se converter em lugares atrativos para as pessoas.
“O ‘Placemaking’ empregado corretamente pode mostrar-nos novas maneiras de ajudar as culturas a emergir”, segundo a Dra. Katherine Loflin, consultora principal do projeto “Espírito da Comunidade”, realizado pela Knight Foundation. O projeto mostrou uma correlação significativa entre a conexão dos habitantes com seus bairros e seu crescimento econômico.
Outro resultado chave do estudo mostra uma relação entre os níveis mais altos de apego das pessoas com seus bairros e o crescimento do PIB das cidades. Isto é importante pois, nas palavras de Loflin, “não reconhecemos, como sociedade, a importância do lugar. Estudos como o ‘Espírito da Comunidade’ estão ajudando a nos darmos a permissão de passar algum tempo trabalhando nesses assuntos de forma econômica”.
A PPS considera que o “Placemaking” é uma parte vital do desenvolvimento econômico. Contudo, durante muito tempo foi colocado em dúvida se esse processo realmente ajuda as comunidades a desenvolver suas economias locais, ou se simplesmente acelera o processo de gentrificação dos bairros. A organização crê que isso se deve em grande parte à confusão sobre o que é “Placemaking” e a quem ele incentiva. Se for um projeto impulsionado pelo desenvolvimento, pelo projeto ou pela arte, então é provável que conduza à gentrificação.
Quem é a comunidade e qual é seu papel?
A pergunta chave neste momento parece ser acerca da propriedade e do pertencimento, o que se refere a quem tem o direito de participar de um processo de “Placemaking” que está em marcha. Em um artigo publicado em Nextcity, se faz referência a NeerajMehta, que coloca as questões:
“Quem vive nos lugares vibrantes? Apenas algumas pessoas? As pessoas com mais recursos? Pessoas são sempre excluídas? Os pobres? Novos habitantes? Minorias?”
Isso se fundamenta em uma frustração comum entre as pessoas que trabalham com o desenvolvimento comunitário e âmbitos relacionado: “A comunidade”, expressão mais simples do que queremos quando falamos de lugares que quase nunca são produtos apenas uma comunidade, mas do cruzamento e da sobreposição de vários grupos diversos. “A comunidade” raramente inclui pessoas que não se comunicam, ou talvez nem sequer notam umas às outras, dependendo da qualidade e da disponibilidade de dar boas vindas aos espaços públicos nos quais se conectam.
Esse é um problema que o “Placemaking” pretende abordar. O princípio mais importante é que o processo deve ser aberto e acolher a todos que queiram participar. Isso não quer dizer, segundo a PPS, que todo mundo obterá o que quer ou espera do processo. Não obstante, o ponto é que haverá uma oportunidade das pessoas compartilharem seus anseios e escutarem as ideias de seus vizinhos, para participar da conformação dos espaços públicos que dividem com eles. O resultado final deve ser um espaço que seja suficientemente flexível para abarcar diferentes comunidades e fomentar as conexões entre elas.
Que papel desempenham os artistas?
Talvez um dos impactos mais significativos do “Placemaking” nos últimos anos tenha sido o aumento da “criatividade”. Os defensores do “Placemaking criativo” – incluindo a Knight Foundation, apoiada pela ArtPlace – tem contribuído substancialmente à consciência pública sobre a importância do espaço público e do papel da arte pública na criação de grandes lugares. Por outro lado, este privilégio de um tipo de atividade sobre as demais também parece ser a fonte de muitas das recentes perguntas sobre quem se beneficia e quem fica para trás.
Roberto Bedoya diz:
“O que vi nos debates e nas práticas associadas ao ‘Placemaking’ criativo é que estão atados a um sentido de ‘lugar’ no entorno construído. Isso significa que opera dentro do marco da política da planificação urbana e do desenvolvimento econômico, o que é bom, mas não é o quadro completo. Sua insuficiência radica na falta de compreensão de que antes de criar lugares de pertencimento, é preciso sentir que se pertence a algum lugar”.
Mesmo que a PPS afirme que as intenções dos defensores do “Placemaking” sejam boas, o fato de muitas pessoas simplesmente não se considerarem “tipos criativos” limita os possíveis resultados. Sem dúvida, parte da campanha é ampliar a criatividade e as artes para um impacto no desenvolvimento comunitário, assim como ampliar o acesso à arte.
Cada lugar pode ser vibrante, porque a vibração é a gente.
A organização também crê que é problemático o fato do debate ter se centrado em uma definição defeituosa de “vibração”, que limita ainda mais a capacidade do “Placemaking” de transformar as comunidades. Ann Markusen, coautora do artigo original sobre o “Placemaking” criativo para a NEA, apresenta o problema em um ensaio que escreveu para o CreateEquite, um centro de gestão das artes, no qual questiona a evolução precoce do movimento. Markusen pergunta:
“Sabemos o que significa vibrante? Tratemos de destrinchar o termo. A definição de ArtPlace diz que ‘definimos vitalidade como lugares com uma escala incomum e intensidade específica de interação humana’, Bonito e vitalidade...são lugares? Escala incomum? Escala em um sentido amplo e intensivo? Por tipos específicos? Que tipos?”
Para a PPS esta definição não só é vaga, como também desnecessariamente limitada. Se a vibração se define como uma exceção, que promove a ideia de que o “Placemaking” está dirigido à produção de determinados tipos de espaços e serviços, ao invés de que os cidadãos utilizem seus espaços públicos para ressaltar as forças únicas de seu bairro e abordar com eficácia as distinções, é possível que tenhamos chegado a pensar na vitalidade como uma qualidade finita após vermos nossas cidades despojadas de suas densas redes sociais, através de décadas de rodovias e suburbanização, mas isso é um erro.
Cada bairro, orla, rua, mercado ou parque pode ser vibrante, mas se as pessoas não sentem que podem contribuir à formação de seus lugares, a vitalidade não pode existir. A gentrificação, que raramente é atribuída aos intentos honestos de criar lugares mais vivos e habitáveis, é o que ocorre quando nos esquecemos de que a vibração são as pessoas, que não pode ser construída ou instalada, mas deve ser inspirada e cultivada. Sylvia Robinson, organizadora comunitária diz: “considero a gentrificação como uma atitude. É a ideia de converter-se em um planificador, olhando um bairro como se fosse uma tela em branco”.
As partes “vinculativas” da cidade se importam e o mesmo ocorre com a forma em que falamos delas.
Quando o “Placemaking” é orientado para um conjunto específico de resultados, afeta o trabalho que cada um está desempenhado e conduz a uma série de comentários, como o de Thomas Frank:
“A vibração é uma qualidade dos bairros ou cidades nos quais há uma arte ou uma ‘cena’, uma porção de restaurantes e mercados de um determinado tipo intelectual, arquitetura emblemática que registre a vida de outra forma e um público de gente próspera que está interessado em todas essas coisas”.
A melhora na comunicação entre as pessoas que dividem e visitam os bairros é vital para o êxito futuro de nossas cidades e da sociedade global, tendo em mente que 70% da população mundial será urbana em 2050. Isso é o que a PPS defende quando aborda o “Placemaking”, argumentando que ele ajuda as pessoas a ter onde sentar-se e conversar com seus vizinhos.
Cada pessoa sabe que está em um lugar quando está rodeada de diferentes tipos de pessoas, mas ainda assim sente que pertence a ele. Quando cada um se sente animado a participar da conformação da vida de um espaço, cria-se o tipo de atmosfera aberta que atrai mais e mais gente. Em sua integração, nossos melhores lugares refletem a dinâmica de uma sociedade verdadeiramente democrática. Por isso, o “Placemaking” deixa às comunidades ver como sua visão e conhecimentos se inscrevem em um processo mais amplo que visa fazer a diferença. Isso lhes permite ser proativas frente a situações reativas, e positivas frente ao negativo. Em suma, o “Placemaking” permite à gente comum fazer melhorias extraordinárias, grandes ou pequenas, em suas comunidades.
Por Constanza Martínez Gaete, via Plataforma Urbana. Tradução Archdaily Brasil.